Tempos passados costumam construir os novos. Mas muitas vezes existem quebras nesta evolução. A indústria dos vinhos tinha tudo para ser centrada no homem, mas graças à audácia de um conjunto de mulheres, a história provou que esta máxima estava errada.
As viúvas pioneiras
O reaparecimento da mulher na indústria vinícola parece-nos à primeira vista uma característica do presente e uma coisa da modernidade. Mas a história mostra-nos exatamente o contrário. A introdução da mulher nos vinhos, apesar de um pouco mórbida, tem hoje consequências positivas e integradoras de todos os géneros neste setor.
De facto, as primeiras mulheres como grandes produtoras de vinhos começaram os seus caminhos com a morte dos maridos, os donos das empresas produtoras de vinho e champanhe. Destacam-se assim duas figuras na construção deste paradigma.
Uma delas foi a primeira mulher a ser dona de uma casa de champanhe, chamava-se Madame Clicquot Ponsardin, viveu durante os séculos XVIII e XIX, e herdou a empresa do marido depois da sua morte. Sob a alçada daquela que é a denominada a “Grande Dama do Champanhe” a empresa focou-se na produção através de uma nova técnica, hoje os champanhes ainda mantêm o seu nome – “Veuve Clicquot”.
A segunda chamava-se Jeanne Alexandrine Pommery, viveu durante o século XIX e herdou também a empresa do marido depois da sua morte. Para além de mudanças na produção, foi uma das primeiras donas de empresas em França a criar um subsídio de reforma e fundos de saúde para os seus empregados.
Hoje em dia, no século XXI estima-se que um terço dos enólogos na indústria sejam mulheres e que um quarto dos sommeliers sejam também mulheres. Por outro lado, a expansão das atividades profissionais ligadas aos vinhos têm permitido uma maior abrangência de tarefas e posições diferentes na indústria.
Filipa Pato: a primeira de muitas
Portugal tem estado em consonância com o resto do mundo e foi por isso mesmo que fomos falar com Filipa Pato, da vinícola Pato & Wouters, produtora de vinhos portuguesa vencedora do prémio enólogo do ano em 2020. Mas mais importante que tudo isto, uma mulher que tem firmado o seu lugar na indústria, não só pela qualidade do vinho, mas também pelo que procura ao produzi-los.
Destaca-se na sua produção o foco em algumas das castas que há 20 anos estavam abandonadas diz-nos. Fala-nos da Baga, uma casta da região da Bairrada que exige, segundo especialistas uma “precisão de um ourives”, ao passo que Filipa nos confirma a dedicação na procura da excelência.
A enóloga considera ainda que a posição da mulher nos vinhos tem vindo a mudar e a ganhar reconhecimento e confessa não ter sentido dificuldade acrescida quando criou a sua própria marca com o belga William Wouters.
Aliás, a International Wine and Spirit Competition realizou entrevistas a 4 mulheres de grande importância na indústria vinícola e apenas uma delas disse sentir algum tipo de discriminação por ser mulher. Podemos até afirmar com base nestas declarações que o domínio da indústria por parte dos homens é uma coisa do passado.
Mas voltando a Filipa Pato, quando lhe perguntámos por uma perspetiva história fala-nos da “Ferreirinha”. A marca Winc inclui a portuguesa como uma das pessoas mais influentes no vinho em Portugal. Mas quem foi esta senhora?
O seu nome verdadeiro era Antónia Adelaide Ferreira e ficou conhecida pelo cultivo do vinho do Porto e consequentes inovações nesse mesmo ramo. À semelhança da francesa Pommery, Antónia Adelaide Ferreira mostrou também uma forte preocupação com o bem-estar dos seus trabalhadores, principalmente na época da Filoxera, a praga mais devastadora da viticultura a nível mundial.
Muitos atribuem-lhe as características de “visão, coragem e empreendedorismo”, daí ter sido dona de uma das maiores fortunas do país. Vivia consoante um mote de “cada um na sua terra deve fazer tudo o que seja para bem da humanidade” – talvez por isso a sua memória ainda se mantenha viva, e não só no Porto, mas em todo o país.
A resposta da Filipa transporta-nos para uma outra realidade, mas que como muitas dizem, é uma coisa do passado. Atualmente, a diferença parece ter-se desvanecido, basta uma pesquisa no Google para encontrarmos um artigo sobre 5 mulheres em 5 zonas diferentes do país que são enólogas, produtoras e CEO. Muitas reforçam uma simples mensagem, interessa a qualidade e a paixão com que se faz o vinho.
Se há diferenças no género de quem produz, parecem cada vez mais inexistentes, e que assim continue.
Fotografia de capa. Fotografia © Grape Things, Pexels, is marked with CC BY-NC 2.0.
Conteúdo produzido por: Diogo Fernandes, Inês Tadeu, Joana Santos, Matilde Calhau e Matilde Nunes no âmbito da disciplina de Comunicação Digital da licenciatura em Comunicação Social e Cultural.